A última festa: A festa que virou um ENTERRO
- Leonardo Rodrigues
- 31 de mai. de 2021
- 4 min de leitura
Atualizado: 4 de dez. de 2024
A Última Festa é um suspense razoável que peca pelo excesso de personagens, de pistas falsas e de subtramas.

A Última Festa, de Lucy Foley, foi publicado em 2019, no Brasil pela Intrínseca, e é o primeiro romance de suspense da autora – o que talvez justifique parte das críticas que tenho à narrativa, já que os outros romances da autora eram históricos e as características de cada gênero são bastante distintas. Este livro foi o primeiro lido no recém-nascido clube de leitura “Clubinho”. De todo modo, A Última Festa tem uma premissa que lembra as de livros de mistério que fizeram sucesso na “primeira remessa” desse tipo de literatura, como os de Sherlock Holmes do Conan Doyle e até os romances policiais da Agatha Christie: muitas personagens reunidas e um assassinato; então, todas as personagens tornam-se suspeitas do assassinato e fica a cargo de um personagem inteligente (geralmente um policial ou detetive) juntamente com o leitor descobrir o que houve.
Vejo um homem se aproximar em meio à neve que cai [...] Ele tropeça a cada passo. Algo de ruim aconteceu.
Entretanto, as semelhanças não passam disso. A obra de Foley tenta, de alguma forma, ter uma originalidade, talvez na inserção de personagens que não estão preparadas para resolver mistérios sobre assassinatos, o que poderia deixar a narrativa mais envolvente e empolgante, pois tanto as personagens quanto o leitor teriam mais dificuldade em resolver o mistério. É uma boa tentativa. Dessa forma, somos apresentados a um grupo de amigos formado por nove pessoas (quatro casais e Katie, a amiga solteira do grupo) que sempre passam o réveillon juntos. Dessa vez, o destino do grupo é uma residência afastada do centro urbano de Londres, para a qual vão também um casal de escoceses aleatório, e a qual é povoada apenas por Heather, a administradora, Doug, o guarda-caças, e Iain, um personagem sobre o qual pouco se sabe e, narrativamente, pouco se tem de importância.
É sobre a falta de importância de algumas personagens do livro que as críticas à obra de Foley se alicerçam, pois, se o intuito é o de dissipar as suspeitas para mais personagens, o objetivo claramente não é alcançado, já que, desde o início, fica claro que a história gira em torno de apenas três personagens, no máximo: Miranda, Emma e Katie (as três narradoras principais, juntamente com narrações de Heather e Doug). Além disso, é claro para o leitor que alguns do grupo de turistas estão lá apenas na tentativa de confundir, por assim dizer, o leitor. Samira e Giles (que têm uma filhinha bebê) mal aparecem; Nick e Bo, o casal gay, parece estar lá por cota, pois não agregam em nada na narrativa; da mesma forma, o casal escocês, narrado como misterioso e exótico, está na história justamente para ser misterioso e exótico; por fim, Iain, o trabalhador ausente da bela residência também “só está lá”.
Se por um lado, a grande quantidade de gente é uma tentativa de manter o suspense e o mistério no ar, por outro, essa tentativa não obtém sucesso – justamente pelo excesso. Prova disso é que os últimos capítulos da narrativa entretêm muito bem já que apenas as personagens que importam aparecem e ver a relação específica entre elas é intrigante.
Além disso, ainda sobre as personagens, elas, apesar de todos terem um backgroud geralmente relacionado a um trauma no passado ou ao modo como se conheceram, parecem apáticas e não conseguem fazer com que o leitor sinta empatia por eles; Miranda é a exceção, uma vez que é a única que adquire uma profundidade além da figura caricata dos outros amigos que são os ricos e bem-sucedidos, mas que sofrem por conta de algum problema particular (quase sempre uma frustação não superada: a amiga “feia” da garota popular; o homem explosivo que teve uma família violenta, enfim...).

O problema, entretanto, é que a profundidade que se tem a respeito de Miranda também não ajuda na criação de um vínculo com a personagem, uma vez que ela é uma pessoa insuportável, o que acarreta o total desinteresse do leitor por qualquer personagem. Assim, sabendo da premissa do livro, que esconde a identidade do assassino e do assassinado até às últimas páginas, o leitor não se importa com quem quer que tenha morrido, nem com quem quer que tenha matado.
Esse desinteresse não é causado apenas pelas personalidades irritantes das personagens: o ritmo da narrativa é descompassado, de modo que o início é completamente lento (e exige uma perseverança grande do leitor para ler mais e mais flashbacks das personagens) e o final é muito rápido e, consequentemente, interessante. Mais que isso, narrativas paralelas surgem e, assim como metade das personagens, essas narrativas também não acrescentam em nada, elas servem para confundir o leitor, mas, de tão óbvias, o leitor sabe que elas são apenas pistas falsas. Infelizmente, até mesmo as narrações de Doug e Heather poderiam ser retiradas da narrativa sem que a história perdesse o sentido, já que tudo o que era “descoberto” em seus capítulos, logo se revelava de uma forma ou de outra na narração das personagens principais.
Admito que cheguei a considerar a ideia de não vir este ano. Simplesmente fingir que não vi o e-mail de Emma na minha caixa de entrada até que fosse "tarde demais" para fazer algo a respeito.
MAS, A Última Festa não é ruim, longe disso, por um simples fato: ele não entrega, de certo modo, o que promete ao se vender como um suspense, pois o suspense de fato só acontece no final; mas ele entrega o que ele é: um romance quase novelesco repleto de intrigas e, particularmente, ler as personagens sendo falsas umas com as outras é legal e até empolgante, afinal, cada uma das personagens tem um arsenal de reclamações um dos outros, apesar de manterem as aparências de melhores amigos por tanto tempo.
Então, o primeiro suspense de Lucy Foley, resumidamente, peca pelo excesso, já que as reviravoltas são convincentes e a história principal em si é bem contada; se os excessos fossem cortados, seria uma bela obra.
É isso! Até o próximo post.
Me encontrem no @leonardojrod em todas as redes sociais.
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