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Opinião: a CIRCE é surtada e FODA!

Atualizado: 4 de dez. de 2024

Circe é uma releitura que, ao que parece, busca humanizar a personagem já tão batida da literatura mundial.


O importante quando se propõe tratar de algo já tão comum às pessoas é que a abordagem seja diferenciada das demais já feitas ou que ao menos se insira novos elementos que dêem à nova obra um ar de originalidade e de autenticidade. O problema da releitura, então, é trazer novidade a algo que a maioria dos leitores já conhece. Circe é o resultado da tentativa de releitura de Madeline Miller de uma parte da mitologia grega que, na realidade, tende a ser esquecida nas obras que falam de tal assunto.


De todo modo, a obra de Miller, publicada em meados de 2019, segue a protagonista, a deusa Circe, filha do poderoso titã Helio, o deus Sol, desde seu nascimento passando por diversos momentos marcantes de sua vida complicada. A narrativa é linear e, a cada capítulo, mais episódios acontecem com a protagonista que narra sua história de uma forma irônica e sarcástica dadas as circunstâncias em que vive, já que, desde criança, por ser diferente, e aparentemente menos poderosa, dos outros deuses e titãs, ela passara a ser a deusa rejeitada pela família, pelo seu interesse amoroso, pelos outros deuses e, enfim, por qualquer criatura divina ou humana.


Da instância narrativa é que se tem o maior ponto positivo da narrativa, já que, com a narração em primeira pessoa, o leitor consegue, ao contrário de todas as personagens do romance, compreender as motivações, as vontades e os pensamentos da protagonista (é provável que a ironia da narradora seja um dos pontos que fazem o leitor se aproximar dela). Assim, Circe, que não encontra apoio em nenhuma personagem dentro da narrativa, torna-se, de certa forma, alvo da simpatia do leitor que chega a "passar pano" para algumas atitudes controvérsias que ela toma, afinal, tais atitudes justificam-se pelo status de "abandono" no qual a personagem vive; mais que isso, o leitor, empático com a protagonista, passa a torcer por ela - e isso é um ponto importante em um romance, já que é extremamente cansativo ler uma narrativa cuja protagonista não seja alguém por quem você queira torcer.

Quando nasci, o nome para o que eu era não existia.

Ainda sobre a escolha da instância narrativa, é por meio da proximidade do leitor à Circe que se constrói o elemento que, ao meu ver, é a novidade que Miller traz em sua abordagem, qual seja, a humanização de Circe. Não que a narrativa a trate como uma humana, considerando sua decendência divina e seus poderes sobre-humanos. O fato é que a narrativa constrói-se a partir dessa linha tênue e ao mesmo tempo abissal entre humanos, deuses e titãs, e, no que diz respeito a Circe, ela não chega a se sentir pertencente a nenhum desses grupos.


Dessa forma, ao mesmo tempo que Circe era deusa, nascida de um dos titãs mais poderosos do mundo, sempre se mostrava mais humana que muitos humanos e, ainda que tivesse características humanas, nunca se esqueceu, ou nunca pôde esquecer-se, de suas origens divinas.


Outro ponto positivo da obra de Miller, um aspecto que talvez seja a origem de um dos problemas do enredo, é o caráter enciclopédico da história que se emprenha em apresentar o máximo de personalidades da mitologia grega. Se por um lado isso ajuda na absorção maior do leitor a respeito da história narrada, fazendo com que ele relembre da importância e dos acontecimentos pelos quais tais personalidades ficaram marcadas no imaginário humano mitológico; por outro, tais apresentações, mesmo que sucintas, contribuem para a instauração de uma lentidão na narrativa a partir de certo ponto.

No passado, já pensei que os deuses eram o contrário da morte, mas agora vejo que estão mais mortos que tudo [...]

De todo modo, Circe é uma ótima e poderosa leitura que faz jus à história da personagem narrada. Quanto à narrativa, a autora, felizmente, apresenta um novo olhar acerca de Circe e utiliza-se de uma abordagem mais humanizada para mostrar as relações contraditórias da protagonista com o mundo em que vivia. Circe só peca, na minha opinião, na lentidão que toma conta do livro a partir, mais ou menos, da metade da narrativa (que pode causar certo desinteresse). Mas vale a pena a perseverança.


Caso já tenha lido, vamos conversar sobre nas redes sociais @leonardojrod.


Caso ainda não o tenha feito, é uma boa sugestão para quem gosta da mitologia grega.


Por hoje, é isso. Até breve.


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