RED HILL: Uma novelona com ZUMBIS
- Leonardo Rodrigues
- 10 de jun. de 2020
- 6 min de leitura
Atualizado: 4 de dez. de 2024
Um apocalipse zumbi que começa eletrizante, mas que se perde numa narrativa novelesca.

O livro Red Hill, da já conhecida Jamie McGuire, autora da bem sucedida saga Belo Desastre, resumidamente conta a história de três personagens principais, os quais também se configuram como as vozes narrativas da história. Para sobreviverem a um apocalipse zumbi e salvarem as pessoas que mais amam, Scarlet, Nathan e Miranda decidem se dirigir ao rancho Red Hill, uma fazenda afastada do pai de Miranda.
Eu sei que o mundo acabou em uma sexta-feira. Esse foi o último dia em que vi minhas filhas.
Scarlet é médica e tem duas filhas, Jenna, de treze anos, e Halle, de sete. É divorciada e, em uma sexta-feira, ela vai ao hospital em que trabalha, deixa as filhas com o pai e, nesse dia, o apocalipse se inicia. Ela então inicia a saga de reencontrar-se com as filhas, em meio ao caos causado pelos zumbis que cada vez mais rápido se proliferam no mundo, e levá-las ao local mais seguro possível: a fazenda do doutor Hayes, um grande amigo da protagonista.
Nathan, por sua vez, vive um casamento de aparências com a esposa, com quem teve Zoe. Sua vida agora consiste em trabalhar e cuidar da filha, uma vez que a esposa não se importa muito com seu papel de mãe. Assim que o pandemônio causado pela a notícia de que havia mortos se levantando e atacando os humanos, Nathan pega a filha e procura desesperadamente chegar a algum local seguro onde poderia cuidar de Zoe.
Por fim, Miranda é a filha mais velha do Dr. Hayes. Ela e a irmã, juntamente com os namorados, estão saindo da cidade grande para uma viagenzinha de fim de semana com destino ao rancho do pai. No caminho, antes de saírem da cidade propriamente dita se deparam com um engarrafamento gigantesco e, depois disso, sabendo o motivo do engarrafamento, buscam chegar ao rancho o mais depressa possível.
E essa é a premissa do enredo criado por McGuire. O foco desse livro é, pelo que pode-se ver, contar uma história comum, de apocalipse e de mortos vivos, de uma forma mais criativa: a partir das relações pessoais e do amor, afinal, a grande frase que move o livro é "quando o fim do mundo se aproxima, pode o amor sobreviver?". Resta saber se a autora realmente conseguiu fazer tal feito de forma interessante e criativa.
A resposta é sim, e não.
Inicialmente, ao saber disso, acreditei que as narrativas em volta de zumbis já estivessem batidas demais, saturadas demais, cansativas demais, mas realmente McGuire dá uma nova roupagem às histórias de zumbi. Essa reinvenção se dá, principalmente, por conta da construção das personagens que são bastante distintas, mas movidas pelo desejo incansável de proteger quem amam. Nesse caso específico, Scarlet é quem mais se desenvolve, pois seu enredo é mais marcante que os outros, uma vez que ela é a mãe que, separada das filhas, busca salvá-las, mesmo não sabendo o paradeiro das crianças. Nathan cumpre o papel de pai bondoso e protetor e, infelizmente, continua sendo assim durante todo o livro. Infelizmente, pois, o que esperamos de um personagem bem construído é alguém que se desenvolve durante a história e que encontra ocasiões que o fazem repensar todas as suas vivências, o que não acontece. Nathan inicia de uma forma e continua assim até o fim. Miranda, talvez por ser jovem, é quem mais apresenta nuances, o que a faz ser, pelo menos para mim, a personagem mais interessante da história.
O início da narrativa é frenético e é exatamente o que se espera de uma narrativa pós apocalíptica. Devo destacar os primeiros capítulos narrados por Scarlet que, no plantão no hospital, enfrenta uma situação completamente agoniante ao leitor, uma vez que nem a personagem (que narra a situação) nem o leitor sabem o que está acontecendo realmente, contribuindo para um suspense crescente, que tem seu auge no pandemônio que se segue no hospital. É a melhor parte, sem dúvida, do livro. Tristemente, é uma das poucas.

Se a leitura flui muito bem durante as primeiras páginas (até por volta da centésima), o resto é maçante e, talvez por conta da tentativa da autora em focar sua história nas personagens e não nos fatos, a narrativa entra em um loop em que as mesmas coisas começam a acontecer sempre - e isso continua até o final. (A partir de agora, talvez, alguns spoilers podem aparecer) Vira algo que poderia muito bem ser resolvido em 50 páginas, mas a história continua por mais 200; a história se torna o que poderia ser o plot (enredo) de uma novela das seis: personagens começam a se relacionar (mas como poderíamos continuar nos amando em uma ocasião assim???); um personagem misterioso aparece, sugerindo talvez uma virada de enredo interessante, que não ocorre e esse personagem serve apenas para trazer mais drama à história (um drama pastelão, infelizmente); outra personagem (do trio de protagonistas, devo dizer) começa a agir de maneira inverossímil com o que havia sido construído no decorrer da história; traições e discussões e tramas desconexas aparecem e a farofa fica completa com acontecimentos sem nexos, como a garota que aparece do nada, juntamente com um suposto pai, e que, descobrimos depois, sofria abusos desse homem (o qual a havia raptado). São coisas que não acrescentam em nada na história: são apenas tentativas de pesar a trama, de deixá-la dramática.
Como eu já havia dito, na análise de Dentes Negros, é bastante possível criar uma narrativa empolgante que foque nas personagens, nos seus traumas e dramas e em suas relações pessoais; o silvaniense André de Leones faz isso perfeitamente. Aqui, entretanto, McGuire se perde numa tentativa malsucedida de dramatizar e de criar uma aura mais sentimental para uma história comumente contada por meio da ação. Fica claro que a ideia é plausível e muito interessante, mas a execução se perde. E isso é triste, uma vez que a narração das cenas de ação são perfeitas. Talvez se a autora seguisse com os clichês das narrativas de apocalipse, Red Hill não fosse tão inovador, mas fosse mais empolgante do que realmente é.
Vale ressaltar, entretanto, que a narrativa não é livre de clichês, o que não é totalmente um problema, afinal, quem não gosta daqueles momentos em que alguém amado é infectado e outra pessoa tem que lutar com seu coração e com sua sanidade para decidir o que fazer com a pessoa que ama, a qual infelizmente já não é a mesma? É até possível notar que é nos momentos cheios de clichês que a narrativa tem menos problemas, uma vez que a autora sabia muito bem a fórmula que daria certo. Seu problema foi escapar dela.
Algumas vezes, gritaram para eu parar, imploraram ajuda, porém, nos filmes, parar sempre significava morrer, e eu mal havia completado dezoito anos.
Mas, no fim das contas, o livro não tem apenas defeitos. Retirando tudo o que já falei que foi problema (que pode ser resumido no tom novelesco de boa parte da história), a autora consegue, em algumas partes, trazer à tona reflexões sobre o modo como as pessoas enxergariam um suposto apocalipse. O trecho acima exemplifica bem o que eu estou falando: Miranda, apesar de ser uma boa pessoa, precisa escolher salvar a si mesma ao invés de ajudar uma multidão de pessoas, uma vez que esta era a atitude menos inteligente a se fazer. Outros personagens também fazem esse tipo de escolha durante o livro, sinalizando que a autora, apesar dos pezares, sabia onde ela queria ir. Só deu uma perdida no caminho.
Enfim, Red Hill, é um livro interessante e as coisas que acontecem nele são convincentes (o que já é um grande ponto positivo), com excessão do final: é quase humanamente impossível acontecer o que acontece no final desse livro. Não darei detalhes, mas qualquer leitor que chegar ao final desse livro vai saber do que estou falando. Apesar da boa ideia, o livro peca no sentimentalismo e na falta de cadência (ora as coisas acontecem correndo ora nada acontece). É uma boa leitura pra quem quer passar o tempo sem pensar muito - até porque quanto mais se pensa, menos convincente fica a história.
Por hoje é só, pessoal.
Espero que tenham gostado do texto. Fiquem à vontade para compartilharem para que mais pessoas conheçam o blog.
Forte abraço. Até a próxima.
Fica aqui minha notinha para o livro:
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